Sábado, dia 06 de abril de 2013, a Avenida Sumaré, em São Paulo, amanheceu diferente. Moro bem perto desta avenida.
Naquela manhã, tinha de passar por lá rumo a um curso de estêncil no
Jardim Miriam Arte Clube – JAMAC. Estava apressada, atrasada, preocupada
com o trajeto que conhecia pouco. GPS ligado, celular com mapa
acionado, toda parafernália tecnológica dentro de meu carro. Dirijo pela
avenida com olhar de motorista que olha sem enxergar o mundo à sua
volta. Desconectada do entorno, conectada ao mundo virtual.
De repente começo a notar algumas coisas balançando nas árvores que ficam no jardim central da avenida.
Barquinhos de papel
pendurados às árvores por um fio. Vejo um, vejo outro e sou tomada de
um encantamento que me desloca e me faz voltar a estar na rua, na
cidade, e agradeço a quem colocou os barquinhos navegando pela avenida.
Pura poesia.
Quero parar o carro e ver com mais cuidado. Não posso. Tenho que ir
para o Jardim Miriam. Pego o celular e peço ajuda. Preciso de ajuda, não
posso perder essa ação, esse movimento que me comove. Meu marido desce
para ver, tirar fotos e depois me contar sobre o que viu e sentiu.
Chego ao JAMAC, uma associação sem fins lucrativos de artistas e
moradores do Jardim Mirian, fundada, em 2004, pela artista plástica
Mônica Nador. Ela é autora do projeto ‘Paredes Pinturas’ (2009). Este
projeto aconteceu em uma comunidade de Santo André. Mônica e seu grupo
trabalharam com esta comunidade dando vida às paredes de suas casas.
No JAMAC, todos os cursos (estêncil, cinema digital, estamparia, café
filosófico) são gratuitos e abertos a todos, principalmente à população
do Jardim Miriam, onde Mônica Nador trabalha e vive. Seu trabalho de
pintura em estêncil quer transformar lugares e despertar o sentimento
pertencimento. Ela disse:“Parto do princípio de que em maior ou menor
grau para cada pessoa, a beleza pura e simples é um dado indispensável
para a sua saúde mental, tendo como exemplo, principalmente, a minha
própria experiência. Tenho ainda a convicção de que a nossa saúde mental
é um item absolutamente decisivo na opção pela sobrevivência do
planeta. Assim, apostando muito mais na vocação
curativa/balsâmica/didática da arte que em qualquer outra que ela possa
ter, minha intenção é fazer a dimensão do belo acessível ao maior número
de pessoas possível.”
Volto para casa no meio da tarde de sábado, no domingo tem mais
curso. Meu marido me conta sobre os barquinhos. Cada um deles tem um
carimbo escrito
‘Desejos Urbanos’
e, junto aos carimbos diferentes, pessoas escreveram seus desejos para a
cidade e penduraram nas árvores. Cada pessoa, que passava pelos barcos,
lia os diferentes desejos.
Eu não tinha um barquinho pendurado em uma árvore da Avenida Sumaré,
mas tenho meu desejo urbano. Desejo que pessoas empreendedoras
criativas, como Mônica Nador, sejam ouvidas, vistas e reconhecidas
porque elas fazem um trabalho transformador para melhorar nosso mundo.
Ana Carmen Nogueira é mestre em Educação, Arte e
História da Cultura pela Universidade Mackenzie. Graduação em Artes
Plásticas. Especialista em Educação Especial com aprofundamento na área
de deficiência visual e Arteterapia. Coordenadora do grupo de mulheres
caiçaras “Saíras do Bonete” em Ubatuba, São Paulo. Desenvolve pesquisa
de pintura encáustica no Ana Carmen Nogueira Ateliê de Artes.